Ensinar matemática




Estava eu numa banca de revistas vendo na parte de psicologia, triste por não ter me empolgado com nada do que encontrava, olhei para o lado e vi algo que me chamou a atenção, um artigo fazendo criticas ao material dourado, material este que todos devem ter usados em suas infâncias, e por mim, muito querido. Abri a referida, não pensei duas vezes, comprei!
Neste momento peço aos leitores, PACIÊNCIA, muitas paciência, pois este post vale muito a pena, mas a revista supracitada é de matemática. Esta palavrinha deve fazer muitos tremer, e peço de novo, leiam até o final se vocês se interessam por lecionar, sejam quaisquer matérias que for.
Transcrevi o texto correndo quando cheguei em minha casa, com o simples objetivo de apresentar essa revista, esta que é culpada por fazer meus olhos brilharem com tantas reflexões sobre didática, artigo sobre neurociências, doenças infecciosas e, claro, matemática.
O artigo abaixo fala sobre aquilo que faz estremecer a base quando se pensa em matemática. Há algum tempo atrás fiz criticas a forma como é ensinado e recebi argumentos que não me bastaram. Enfim, por favor, comentem, compartilhem, acho que é um texto que só vem a acrescentar. Obrigada pela atenção e boa leitura.

As frases a seguir foram retiradas de livros de matemática. Eu as escolhi não porque sejam excepcionais, mas típicas.
“Todo quadrilátero convexo, cujos ângulos opostos são suplementares, é inscritível.”
“Função e uma regra que determina, para cada elemento x de um conjunto não vazio X, um único elemento y de um conjunto não vazio Y; ela pode ser escrita como y=f(x), onde f denota a função.”
As duas têm uma característica eu julgo indesejável- não mostram ninguém fazendo nada. Muito autor escreve páginas e páginas dessa maneira; passa a impressão de que os conceitos matemáticos fazem coisas porque lhes dá na telha. Duvido que tenha sido seu propósito. Antes, provavelmente não sabe como um leitor reage à voz passiva e à ativa.
O problema dos livros nos quais o autor recorre à voz passiva do começo ao fim, e sem pensar, é que o estudante pode usá-los para pintar uma imagem distorcida da matemática. É uma imagem comum, na qual as coisas da matemática habitam um universo paralelo; se a espécie humana desaparecesse, parece que sua matemática sobreviveria incólume nesse universo paralelo.  Com uma imagem dessas na cabeça, o estudante  talvez ache que pode ganhar acesso à matemática imitando certos feiticeiros – basta implorar misericórdia de um dos deuses desse universo, entrar em transe e olhar o mundo novo à sua volta. Ao fim do transe, é só descrever o que viu.
É claro que o estudante não pensa dessa maneira e com essas palavras. Mas, contaminado por anos de livros na voz passiva, ele se ilude quanto à verdadeira natureza da matemática. E se o autor pensasse melhor em quem está fazendo o quê? Veja como poderia reescrever a primeira frase:
“Se você verificar que os ângulos opostos de um quadrilátero convexo somam 180º, saiba que pode inscrevê-lo.”
Se todo autor escrevesse desse jeito mais vezes, penso que haveria mais estudantes com noção de que, para construir um universo matemático dentro da própria imaginação, deve ler, resolver exercícios e problemas, tomar notas, desenhar, escrever a resolução na forma de ensaio. Deve agir.
Mesmo que os autores mudassem da noite para o dia, há centenas de milhares de livros  já escritos da forma convencional. Só resta ao estudante aprender a ler uma frase em voz passiva com sujeito humano indeterminado e convertê-la mentalmente numa frase com sujeito de carne e osso: ele mesmo.
Márcio Simões
Revista: Cálculo: Matemática para todos. Segmento: São Paulo, ed. 48, jan 2015. Pág. 5.



Transcrito por: Psic. Auria Amadori

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